By Denise Souza (a mão do desejo) Dublin - Ireland
“Uma palavra bem grande, instransponível. Tire o chapéu pelo
menos, disse ela.”
(Samuel Beckett – O primeiro amor).
“O acaso é o grande senhor de todas as coisas. A necessidade
só vem depois.”
Luis Buñuel
Lentamente, ela caminhou até a luminosidade natural. Abriu
as janelas da varanda, com as duas mãos segurou o tempo, a umidade noturna
molhou seus dedos firmes. Chorou. E pensar que não era seu forte
sentimentalismo existencial, naquele dia a sensibilidade tomou conta de seu
corpo, era como se o Ser fosse mais profundo que a filosofia moderna no
caldeirão pós-medievalismo, que o Ser tivesse uma transcendência.
Respostas em agrupamentos de dados jogados do alto de sua
estima eram o resultado de sua dor. Os dados ficaram parados no ar, no feixe de
luz que entrava pela brecha da varanda. Ela permaneceu em silêncio, as horas
eram esquecidas pelo tempo de seu coração dolorido. Quando veio o fim do dia, o
frio da cidade, o vento tomaram o lugar da luz, e a brisa retirou toda sua
náusea, toda sua vontade de se perder.
A infinita reflexão é sempre maior que a certeza da vida. As
ideias voltaram aos poucos. Era como se tivesse tomado um remédio para algo que
nem sabia, o efeito alucina a sólida certeza de ser só no mundo. A vida estava
restabelecida. Um rasgo de ar fresco dissipou os dados, que, sumidos junto ao
sol, não passavam mais do que uma ilusão.
Deu um grito. Ao fechar a porta da varanda, e voltar ao
pensamento sobre a condição e possibilidades de sair das impossibilidades do
Ser, voltou para sua alma. Sua morada. A unicidade de cada um, o exemplar
brutal em vida.
O vilipêndio diante das coisas corriqueiras é só um pretexto para se afundar de vez na simplicidade das pequenas e sinceras mentiras da vida, e que tudo de mais é simplesmente grandioso só pelo fato de sentir, ver, desenhar, interpretar a arte mínima do Viver. Deu-se conta do movimento entre a luz e a porta que se fechou: o movimento estava entre o abrir e o fechar no interior de sua alma.
O intransponível, uma palavra do pensamento foi como
entrar e sair de um lado ao outro. O estrondo do céu na escuridão do tempo, um
sopro beckettiano tomou conta de sua vida.
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