“Ora, aqui não se trata apenas de
confrontar ideias mas de as encarar e fazer viver, e só experimentando se pode
saber do que são capazes.”
Maurice Merleau-Ponty
A vida é breve. É o tempo insuficiente para se dar o
fim de todas as dúvidas. Li certa vez em um livro, do qual não me recordo o nome,
que a brevidade da vida é que faz um ateu, que o mundo é vasto demais para se
ter tempo de senti-lo, que se Deus existe se precisaria mais do que um século
para conhecê-lo. Herético esse livro. No mínimo eu deveria suprimir todas as
dúvidas filosóficas e existenciais que vem no andar dos dias, na velocidade do
tempo.
Ando em busca do tempo que fale mais aos meus ouvidos,
não do tagarela moralista a incomodar o lado mais puro, ou seja, crer no não
crer é uma atribuição saudável ao Ser.
Pensando bem, não li em livro algum, foi um texto que
comecei escrever ainda quando era um jovem estudante de filosofia. Na época
queria ter a possibilidade de conhecer o mais longe possível sem abrir mão de
brevidade do presente, sem ceder um segundo do presente vivido. Com o passar dos
anos, dei-me conta que jamais chegaria ao nível de um sábio pensador, pois o
presente estava colado ao corpo. Conseguia no máximo divagar em átimos de
solidão que pudessem silenciar diante dos alaridos das pessoas, dos
professores, dos amigos, da namorada, etc. A partir de um dia, não lembro mais,
teve um dia sim, uma manhã em que acordei com a grande revelação. Pensei, disse
em voz alta ‒ não vou mais tentar vencer a dúvida, vou viver a contingência na
coexistência, me apropriei de Maurice Merleau-Ponty. Desde já, o “sempre”
começou a fazer parte de meu vocabulário, até tive problemas com o “sempre”. Um
professor disse-me certa vez que não devia escrever num texto acadêmico “sempre”.
Refleti. Acatei momentaneamente o comentário. Depois retornei à expressão do
“sempre”, penso, tento abraçar a linguagem, mas o formalismo nos mete medo
criando regras. Muitas vezes as regras são descumpridas em nome da liberdade,
da criação, das leituras que possamos ter do “sempre”. Nem o próprio professor
acreditava no que estava a falar, pois quando se pensa o pensamento já se está
no mundo da incerteza da existência do pensante.
Passado os dias, escrevi que o legado da modernidade
hiper-racional, que a fundação de um mundo que não consegue mais dar conta de
seus pressupostos racionais sobre o mundo. Voltei ao professor, entreguei o
texto, com alguns “sempre”, ele me olhou com uma expressão de quase um desde
sempre e sentenciou: “maravilhoso, está pronto, precisa de pequenos reparos”.
Volto à brevidade das coisas. O ano do meu nascimento,
1961, morria o filósofo francês Maurice Merleau-Ponty, para muitos o filósofo
do que sobrou dos grandes, que não serve para atar o sapato esquerdo de Hegel
ou de um Kant. Mas minha simpatia a ele é de longa data, talvez o nome bonito
de se pronunciar fez conhecê-lo um pouco mais. Leio até hoje com a frequência
desorganizada de um “sempre” fora de ordem e um não seguir de regras definidas
de estudo.
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