segunda-feira, 1 de setembro de 2008

História(s) do Cinema e o Editor de Romances



História(s)do Cinema de Jean-Luc Godard



“Beleza...jogo em si que o homem joga com seu próprio símbolo, pois é sua única chance de escapar, mesmo que simbolicamente, à sua angústia da solidão. Repetir do sempre auto-sugestão, a fuga na beleza. O jogo da fuga.” Jean-Luc Godard


Fiquei morto na cama até ao meio-dia. Não havia mais Lana para me fazer um pouco feliz. Olhando as paredes. Via com desprezo a foto dela ao lado do telefone. O que me deu ter pensado nela essa noite? Pensei em tomar uma xícara de café. Fui direto à cozinha. Tropecei em algo, olhei para baixo e eram uns cds esparramados ao chão. Pude ver o estrago causado por ela nessa casa, na cozinha, no meu corpo em fragmentos. As vísceras acesas como uma vela que queima silenciosa dentro da alma. O vidro de café vazio. Mais fios de cabelos sobre à mesa, e por onde ela passou ficou um pouco do desalinho desta história. Eu estava de volta ao apartamento depois de uma temporada na Espanha para divulgar meu livro. Aqui no Brasil eu era despachado até por bilhetinho e Lana partira assim como chegou, por mensagens.
Sentei em um canto da cozinha. Perplexo, com lágrimas nos olhos não conseguia tirar minhas mãos do vidro de café. Apertava com os dedos como se estivesse segurando as mãos na hora da despedida de um despenhadeiro. Era patético mas de uma irrealidade comovente para quem gosta do Gregory Peck quando salva Ava Gardner em “O Grande Pecador”. Lá eu estava em nesse jogo, no abismo do jogo, do penhasco olhando o fundo escuro da história.
Preso à idéia da compreensão de que tudo me afastava do ponto da cor perdida no teto mofo. Um vermelho lá no canto. Lembrei das “Anotações sobre as cores” do Wittgenstein. Aquele cara era um veado que quis pôr fim na filosofia e depois ficou nas cores. Pronto. Lá estava eu olhando para o teto. Onde teve um início era uma questão de ter existido o acontecimento. Minha vida. Se as palavras como diria Gadamer brotam da comunicação que o homem faz com do mundo, onde estaria minha compreensão naquele momento? A solidão tinha tomado conta de todo o ar. A cozinha estava ali, o cheiro de café, as lembranças de um cigarro queimando enquanto eu falava sobre as palavras ditas e silenciadas pelo tempo. Quem de nós dois pudera alcançar esse momento? Lana certamente voltaria para o seu nada, mas seu nada estaria repleto de vida. Enquanto o meu nada é repleto de nada de uma elegância assustadora que só serve para encher os bolsos do dono do boteco ou do psicanalista. O cigarro apagado e o batom vermelho sobre o cinzeiro.

“O desespero da arte e sua tentativa desesperada para criar o imperecível com coisas perecíveis, palavras, sons, pedras, cores para que o Espaço composto dure para sempre.” Jean-Luc Godard

continua

Um comentário:

Anne Petit disse...

O vazio. Um vazio que preenche lugares. A beleza é um conceito vazio. E a solidão caminha ao lado da beleza.Me senti pegando a mão de Lana e caminhando com ela em direção ao nada que tem vida. O nada elegante e sombrio me assusta.
Lindo. Tocante demais.
Estava saudosa de palavras que me fizessem viajar e resolvi passar pela Maquinaria. Boa semana!

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