domingo, 2 de janeiro de 2022

Prendedor de Sonhos - 2022

       Almada- Tejo
   


“pedaço de mar,

iça, onde moras,

sua capital, a

inocupável.”

Paul Celan

 

 

Vou no som do murmúrio das águas, das mãos estendo histórias sobre o dia até o sol se pôr. Da voz escorre a umidade das letras em pele e olhos negros se perdendo nas entranhas do tecido. Das vestes, cores roçando o corpo e dedos que dedilham mais uma pintura da carne, o toque na tela, um riso perdido no ar, o arejar das pernas no vento que traz o aroma da eternidade do tempo. Pendurar a vida nas cercas da casa próximo ao mar, deixar escorrer na leveza do amor morto na natureza, dormir relendo o noturno da insônia do ano que não acabou.

Acordar em frente à janela escancarada do novo dia, um cheiro vindo da manhã com café e calor. O vento de chuva passou longe de meu sonho, do suor da vida acumulada pela idade, o correr cedo para ir nadar em fuga do que já é mofo, molhar a alma, folhear as ideias em nascentes de rios e livros que insistem em viver.

Secar-se diante da solidão, encontrar forças na respiração, arredar a máscara, tomar fôlego e colocar a louça para lavar e secar junto às roupas perdidas no tempo. Bem antes da tempestade fria, do esquecimento e do perigo iminente do mal, ensaiar novo álbum dos que lutam. Mais uma viagem até o pátio, um carnaval de samba e rappers, vozes femininas, sinfonias eternas, rufar dos acordes sem orientação alguma, um caminho imaginário até o mar frio do norte. Chuva e sol, corpos lado a lado partem na primeira nave diurna do primeiro domingo.

 


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