segunda-feira, 2 de julho de 2007

L’Amour em Fuite




“Toda vida é um processo de demolição.”
Scott Fitzgerald



Nos encontramos pela última vez na saída de uma sala de cinema. Eu e Sofia tínhamos vivido um amor ainda quando jovens. Eu tinha 25 anos e Sofia tinha acabado de completar 22 anos. Olhei, diante do ombro de um cara com a namorada, Sofia e um sujeito. Talvez o seu namorado. Soube dias depois que se tratava de um cineasta em ascendência, e que tinha ido buscá-la em São Paulo. Até isso o cara fez a mais. Eu tinha ido ao inferno por todo amor que deixei o tempo sugar das minhas entranhas. Todo caso, ela me olhou de soslaio. Sorriu. Talvez pelos meus quase 40 anos, pelo meu jeito de idiota, sem nenhuma garota naquele momento. Sofia caminhou em direção ao café, eu a segui, e perguntei o mais óbvio e patético, - Como tu estás bem. Nem parece que o tempo se alojou em tua pele. O mesmo sorriso, o teu cabelo comprido, assim fica melhor do que a última vez que nos vimos. Ela responde – Antoine, a última vez que nos encontramos tu estavas irreconhecível e com olhar de quem fugia, de quem esperava alguma pessoa ao mesmo tempo. Acho que tu estavas muito bêbado. E como eu estava com o cabelo do mesmo jeito. Sei lá... Isso já faz dois anos, né? Chega de rodeios, o que pretendes? Já não chega... Nesse momento chega um sujeito mais velho que eu, porém bem vestido, e como um velho pergunta se está tudo bem. Eu dou um sorriso e saio em disparada. Vou à rua como a primeira vez que tinha encontrado Sofia. Sem sentir direito as pernas, caminho em direção a minha casa, o único lugar seguro em que posso ouvir Coltrane e Hartman. Torpe são os sujeitos que perguntam, diante de uma mulher, o que um outro está ali interpelando. Deu vontade de voltar e dizer algumas verdades. Mas não havia mais verdades a serem ditas. Tinha vivido um amor maiakovskiano, rilkeniano, e agora só restava o olhar vazio. Atordoado, ainda pensando no filme que tinha assistido e esbarrava na velha paixão. Fui diminuindo o passo, aos poucos comecei a pensar em Truffaut. No filme que assistimos juntos, Choramos juntos na possibilidade do amor dar certo. Talvez tenha dado certo, sim, ontem mesmo eu vi uma garota chorando na rua por ter brigado com o namorado. Parei. Olhei para ela e disse: -esse cara gosta de ti. Não importa que ele te deixe assim na noite, na realidade será dele a lágrima final.
Uma homenagem ao cineasta François Truffaut e ao filme «Amor em Fuga »
Jean-Pierre Léaud : Antoine Doinel
Claude Jade : Christine Doinel


Luis Gomes

2 comentários:

Ju disse...

Li seu texto ao som de Billie Holiday. sinestésico, não?
bj!

Anônimo disse...

todos ficamos velhos e nada mais importa !

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