“A arte só está próxima do absoluto no passado, e é apenas no Museu que
ela ainda tem valor e poder.”
Maurice Blanchot
Meu grupo é tão seleto que não
existe, vivo no limbo da desatenção, permaneço só. A multidão amordaça, é
calada, dizimada que nem cauda da serpente explodindo por balas perdidas. Vejo
no espelho o movimento do corpo, a luz difusa, a névoa de um domingo quase sol
meio cinza. Corro louco, feito refugiado, do meu próprio país para ver o mar. Não
olho para trás nunca mais é forte demais. Fuga dos sonhadores, minha alma
dentro do casaco cinza que atravessa o frio sem se entregar. Depois, nado fundo
para não mais voltar. Jamais. Sigo em braçadas até o fim do livro. Leitura
voraz, audição do silêncio. A mesma cena que passa aos olhos é um filme
autoral, a mesma cruz um sonho insistente de causar questionamentos. Ouço o
tilintar do pensamento, notas dissonantes, ritmo das pernas, braços em sincronia
ao bater na água. O presente é apenas um arremedo do passado aos que não
resistiram às tempestades. Demarco uma linha imaginária na tela, traço fugas,
planejo novos roteiros em novas cartografias do coração. Enfim, terminei a
leitura e o céu abriu o clarão das ideias.