“O temor de ferir e o medo de ser ferido estão nas
próprias falas.”
Maurice Blanchot
A
possibilidade de driblar a escrita, a ideia falseada num tipo de cromatismo
andante, quase permanente contínuo, fugindo do sentimento, a se mostrar na própria
linguagem de uma performance. A ida é proporcional ao tema, como se fora a
combinação numérica, de linha a linha, na tela, o texto se forma, reconstrói o
pensamento sem sair da ideia de outro texto que poderá não chegar em algum
outro lugar, pois sua combinatória é ir no andar dos corpos, simétrico no
lançar dos braços na água, no ritmo do nadar, do correr...ad infinitum, a contar que o tempo não se esgota, a configuração da
linguagem poderá ir adiante, atravessar o oceano, descansar em terras de um dos
últimos universalistas da história da música, morar ao lado de Saint-Saëns.
Poder
acordar no som silencioso da vida que adormece na fuga, no domingo cinza de um
fim de mundo tomado de vegetal cerebral, um afronto à flora, aos sons, onomatopaico,
combinações de panelas e zum-zum de sirenes que protegem a saída dos criadores
da vida.
A
vida é uma combinação do desejo de fazer com a organização sentimental do criar
dentro do modelo moderno, legado dos legítimos donos da cultura, e o desapego
disso tudo que é a busca do limite da sensibilidade com a pureza da criação. Um
novo constructo do fazer.
Volto
ao abrir do dia, o acordar bem distante, na separação e proporção compassada e numérica
dos olhos, os dedos que movem, atravessam o parque ainda úmido da noite, o
cheiro diferente, a origem de seu corpo e o novo respirar bem longe dos
caçadores de talentos, dos dromedários que foram cultuados pelos protetores dos
museus. Os mesmos que impulsionam o ódio porta a fora, os mesmos que confundem
arte com a moral, da caixa secreta de horrores e famílias que ainda brotam da
botas sujas de lama e sem nenhuma aptidão para o ato de pensar e silenciar ao
novo.
O
que escapa dos sentidos domesticados é a ruptura com todos os sistemas,
permanecer no caminho com todos os lados da vida em consonância às formas de
linguagem que estão soltas no tempo.